sexta-feira, 21 de agosto de 2015

velhice

Ontem, na praia, fui fazer uma corrida. Devo ter corrido uns três quilómetros - quando parei. O coração emergiu da sua caixa e foi-se estatelar ao comprido na minha boca, e também o iPod decidiu desbaterizar-se e dar por terminada a contribuição para o galopar do esforço na areia. Dei comigo na praia ao lado, numa de nudistas. Selvagem e semi-deserta. Homens e mulheres bronzeados sem qualquer marca de branco lixívia, a perpetuar uma peça de roupa de pele inexistente. Continuei a caminhar, e distraí o curioso, vulgo mirone, em mim com a vista do mar. Mais uns metros caminhei para Norte, contra o vento, quando decidi voltar. Nesse regresso, um senhor com idade, calculei, para ser meu avô, cruzou-se comigo como veio ao mundo. Inevitavelmente, olhei para todo ele como matéria viva. E por meros instantes, tive um vislumbre do meu futuro. Flácido, encarquilhado, engelhado, tormento, horror e desgraça, o que me espera - o futuro - ó mentes perversas. Se lá chegar, é claro.
Mais tarde, na esplanada, em conversa com uma amiga, falámos casualmente de como o tempo passa rápido e que daqui a dez anos, teremos 50 anos - meio século. Assustou-me, pontualmente, porque me revi na velocidade supersónica dos mesmos últimos que passaram e nos quais pouco ou nada fiz digno de ser registado. Parei a mente por breves segundos, fechei os olhos, senti o sol nas pernas, respirei profundamente, voltei a abrir os olhos e olhei para o horizonte. Uma gaivota rasgou o céu em voo picado. Um odor a protector solar atravessou clandestinamente a atmosfera. Uma empregada piscou-me o olho quando lhe pedi um cinzeiro. Na mesa ao lado, uma velhota com um chapéu lindíssimo de palha deu uma gargalhada sonora. E a bandeira estava amarela. Pensei: o tempo é aquilo que faço dele. Como uma espécie de moldar plasticina colorida. E estar em cada sessenta segundos de peito aberto, absorver cada preciso e precioso instante, o aqui e o agora, também será uma parte do muito proclamado «saber envelhecer bem». Quando olhar para mim, se lá chegar - repito-me -, aos oitenta ou ligeiramente menos, quero ver a minha história de vida na pele quebrada e rugosa do corpo vergado pela fúria amante da vida. E quero muito rir de mim próprio, todo nu num areal qualquer.

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