terça-feira, 1 de julho de 2014

ciclos

Falas-me sobre ti e dizes que chega. Que acabou, que o capítulo se fecha aqui. Depois dizes o que mutila, me corta as pernas, amputa braços, arranca dentes, puxa cabelos pela raiz, tudo isso, mais os tremores interiores da ansiedade que assusta, o coração a bater na garganta, o olhar raiado, e, novamente o coração, ainda mais furioso, a querer espumar-se da boca seca. Que mereces melhor. Que vais à tua vida, por mais cabeçadas que dês, um dia, pelo menos, hás-de acertar uma, uma seta no centro desse alvo chamado felicidade. Sweet Jane. Felicity Pearl.
Que estás cansada do convívio doentio a três, e que o pouco que te resta da dignidade, há-de tomar a proporção de um titã a segurar os céus. E que vais renascer, em Paris, Nova Iorque, Banguecoque ou na Cochinchina, que muita gente nem sabe que fica no sul do Vietname. Mas Ho Chi Minh já não é capital de guerra, e tu estás farta de todos os meus torpedos, morteiros, napalm, gases que ardem na vista e que escalpelizam lágrimas. Que chega.
E eu, em silêncio, mergulhado em ciclos de passados e com vista turva no futuro, encerro a mesma e penso, há quanto tempo queria, por mais que me matasse, ouvir-te detonar tais palavras.
Depois, num lampejo, de uma clareza interior, acabo por sentir o coração a desacelerar, o comboio interior da respiração a abrandar, a lenha a queimar de forma lenta na locomotiva do corpo, esboço um sorriso familiar, aquele que deixa partir o que não deveria de partir, o sorriso dos que perdem, de quem sente a saudade do que ainda não foi, mas que está a ser, que está a ir embora. E neste estremecimento febril, lágrima presa que teima em não escorrer no rosto gasto e escavacado, os meus sentimentos dirigem-se para os teus caminhos de amanhã, que possas, sim, que possas conquistar os novelos que te sirvam as medidas nos tecidos de prazeres que hás-de vestir, como me disseste, que as palavras te sejam manto de realidade e não uma história qualquer falhada como a nossa.

Desligo. E ecoam-me as tuas últimas sílabas – hás-de-a-ca-bar-so-zi-nho.