quarta-feira, 11 de junho de 2014

improvável

Meu Deus, de alguma forma, sinto-me improvável. Porque gosto de me envolver e envolver-me é insuportavelmente improvável. Sabes que é assim na maior parte das vezes - murmuro agora. Dias houveram em que me perguntaram o que espero da vida. Não espero nada. Sou demasiado orgulhoso para esperar o que quer que seja. Que correntes queres quebrar? Nenhumas - respondi em ingenuidade. Digo-te que quero ser o último a extinguir-me. Como o sol e, maravilhado pela imaginação, não posso deixar de sorrir. Ele será o último. O último a extinguir-se, para lá de qualquer constelação, para lá de qualquer suspiro, para lá de qualquer movimento, para lá de qualquer natureza. Como aquele beijo que transcende sem transcender. Sabor da promessa de ficar. Como único e singelo gesto de se realizar. Deitas-te. Para o ar. Fechas os olhos e admiras o escuro. O escuro do teu interior, das tuas pálpebras, no fundo - e, tu sabes -, o escuro da testemunha que és. Se existe um ponto de retorno, o ponto onde a tua mente desagua - garanto-te - esse ponto está aqui. Vincado e definido. Anseias em aproximar-te. Tens medo do que possas sentir. Fundes-te com o sempre e com o sempre de sempre. Esquecer. Esquecido. Lembrar. Lembrado. Não voltes a ti hoje. Abraças uma árvore. A vertigem do alto de um grito confundido e da memória obsoleta. Temes o perfilar dos segundos, os minutos, as horas, os segundos outra vez, as horas outra vez, os dias todos de uma vez. Acelera-te o coração - não sabes parar. E vem-te à cabeça – sim, certo - as escolhas. As tuas tardes de quarta-feira, de segunda-feira, de sexta-feira, as tardes que forem. Dias da semana em que escapavas e te escondias com uma pungente palavra por revelar. Uma palavra por dizer. Algo que não saía. Uma palavra que se podia imolar no limiar dos sentidos e que desperta em ti a eterna lembrança. Estás aqui. Não acreditas que estejas, e não acreditas no que vês, mas estás. Se ao menos eu pudesses acordar. Mas, meu Deus - quem quer que sejas, carne e osso, ar e sal, meu Deus, eu devo ser improvável. E, no limiar deste caleidoscópio de sangue e tecidos, esqueço sentidos e perco-me. Não demoro muito, saber-me partido. É sempre assim.

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